sábado, 25 de abril de 2009

Discos Essenciais - Megadeth "Countdown to Extinction" (1992)

No começo dos anos 1990, logo após comprarmos um CD player, me vali do acervo das locadoras de CDs (notadamente MadSound e TV3 Vídeo, e em menor medida a extinta Vídeo World - que ficava ao lado da TV3 -, CD Express (que ficava na Av. Independência, em frente ao Hospital Getúlio Vargas, quase esquina com a R. Garibaldi) e Symphony (que ficava na R. José Bonifácio, do lado da Igreja Sta. Terezinha). Aluguei muitos CDs nessa época, para conhecer todo o tipo de banda de heavy metal e hard rock. Naturalmente aluguei CDs do Megadeth, no caso "Countdown to Extinction" na MadSound e "Rust in Piece" na Symphony.

Geralmente gravava uma C-60 para poder escutar o disco mais vezes, e lembro de ter escutado apenas uma vez o backup que fiz para "Countdown to Extinction" em 1993. Estava quase dormindo com os headphones, mas fiquei com uma excelente primeira impressão da banda de Dave Mustaine: pelo menos as cinco primeiras faixas eram muito boas, com guitarras bem gravadas e executadas com precisão, além de uma bateria bem dinâmica.

No verão de 1995 a banda já havia lançado "Youthanasia" e a MTV exibia regularmente o clip de "Train of Consequences", cuja música era muito legal. Meus amigos estavam todos na praia (Laguna/SC), então só me restava ouvir música e tocar meu violão recém adquirido. Numa tarde quente, resolvi comprar na Multisom do Praia de Belas tanto "Countdown to Extinction" quanto "Youthanasia", e lembro do orgulho de trazer para casa dois CDs novos de uma banda contemporânea (e não dos anos 1970 que costumava ouvir), no espírito "comprar para conhecer melhor".

"Countdown to Extinction" se revelou um disco extraordinário, que representou a culminação da carreira do Megadeth em direção a um disco de sucesso de vendas. A banda sempre teve vendas expressivas, com discos de ouro e de platina desde a estreia com "Killing is My Business... and Business is Good", mas Dave Mustaine buscava o sucesso absoluto que era desfrutado por seus antigos companheiros do Metallica. Assim, depois de um disco obra-prima do prog-thrash-speed-metal que foi "Rust in Piece" de 1990, a banda gravou "Countown to Extinction" em 1992 com composições mais curtas e diretas, sem prejuízo da complexidade dos riffs e da dinâmica das músicas, sem contar as letras expressivas, com críticas a certas hipocrisias, ironias sofisticadas e frases de efeito memoráveis (a expressão "Black tooth grin", da faixa "Sweating Bullets" acabou virando nome de uma bebida preparada pelos integrantes do Pantera e o Zakk Wylde).

Assim, o disco abre rápido e rasteiro com uma das minhas favoritas, "Skin O´My Teeth". A faixa tem um riff que utiliza as mesmas notas do clássico "2 Minutes to Midnight" do Iron Maiden (A na 5.ª corda solta e os power chords invertidos C, D e A), mas com muita rapidez e precisão. O riff do refrão é daqueles complicados, com saltos de cordas, e como tantos outros serve para mostrar que Mustaine é "o cara" ao tocar um riff complicado e cantar sobre ele. O solo de Marty Friedman é espetacular, com muitas notas mas bem composto e colocado sobre a base de Mustaine (um riff diferente). Depois do solo é reprisado o começo da faixa, e na pausa Mustaine toca as cordas com a palheta dando um efeito muito legal, como se a guitarra estivesse dando uma espécie de freada.

Depois de uma música rápida, nada melhor do que uma com andamento mais cadenciado, e se se tratar da melhor faixa do disco, tanto melhor. Segue-se um dos maiores hits da banda, "Symphony of Destruction". O riff é muito fácil de tocar, e não há demérito algum nisso - há muitos riffs fáceis de tocar e que são matadores. O mérito da composição é todo de Mustaine, que criou um riff, como dito, fácil de tocar, mas sofisticado de certa forma, com várias pausas entre F-E--E, F-E--E, e cordas abafadas em F-G-F. Essa parte acompanha todos os versos até o pre-chorus com a 5.ª corda solta e uns double-stops harmonizados na 3.ª e na 2.ª cordas, até se resolver no riff que serve de base para o refrão, bastante melódico por sinal e com cromatismos interessantes. O solo é um dos melhores de Marty Friedman, e já li depoimento do cara no qual ele relata a sua composição: começa com poucas notas para dar lugar à debulhação de arpejos bem colocados no decorrer. A composição é perfeita.

Um dos riffs característicos de Mustaine é do tipo locomotiva, com bastante trabalho para a mão direita em termos de upstrokes e downstrokes. Um bom exemplo é o início de "Architecture of Aggression". Não tenho notícia dessa faixa ser tocada ao vivo, mas é uma das minhas favoritas. Tem várias partes e, mais uma vez, tem um riff sofisticado durante o refrão. Quando li o livro de partituras desse disco, dei uma conferida na transcrição do solo e aí me abri para o Friedman: o cara toca notas que jamais havia imaginado que fariam algum sentido. Esse é o trabalho do cara, compor solos espetaculares.

"Foreclosure of a Dream" tem um clip muito legal para a MTV e é uma faixa mais básica em termos de Megadeth. Friedman faz um dedilhado sobre o qual Mustaine toca umas notas oitavadas dando a melodia. O refrão é simples: G-F, C-Bb, e no final modula para A-G, D-C, sendo certo que isso se trata de um recurso comum na música pop, para viabilizar ainda maior repetição do refrão. A música é repleta de solos pequenos.

"Sweating Bullets" é outra com clip na MTV, no qual Mustaine representa o tempo todo alguém "mentally disturbed" retradado na letra. Desta vez o solo é de Mustaine, e é um dos seus melhores, com cromatismos e tudo mais. Há ainda um riff que utiliza outro tipo de cromatismos lá pelo meio, e é um dos melhores exemplos de como ele se utiliza desse recurso. Os versos todos são no estilo start-stop, com os acordes Bb-A-E tocados de forma bem rápida e seguidos de longas pausas nas quais Mustaine canta coisas do tipo "Ya just keep on thinking it´s my fault, stay a inch or two of a kicking distance".

Essas músicas, até aqui, são todas diferentes umas das outras e são as de maior destaque do álbum. Mas as seguintes servem para demonstrar como Mustaine consegue ser sofisticado na composição de riffs e músicas sem precisar entopi-las de múltiplas partes, e acomodá-las em faixas de 4 a 5 minutos.

É o que digo sobre "This Was My Life", notadamente nos versos que são acompanhados pelas guitarras tocando notas sobre acordes ascendentes. No riff de abertura - e que serve de refrão - aparecem os cromatismos com power chords, bem básico. A faixa título, por sua vez, é conduzida nos versos pelo baixo de David Ellefson. Aparentemente a faixa, que trata de espécies ameaçadas de extinção, foi premiada por entidades afins a essa problemática ambiental. "High Speed Dirt" é outra com andamento acelerado e tem um riff inicial - e principal - bastante longo, cheio de partes, bem complexo mesmo, e muito bom. No final há uma pausa para um solo de Friedman com guitarra com timbre limpo, uma raridade e que conferiu à peça um certo sentido rockabilly. É o tipo de tentativa que os caras resolvem fazer por sugestão de alguém e que dá bastante certo. "Psychotron" poderia parecer para alguém uma espécie de "filler", mas acho uma boa faixa, que não foge do estilo do disco. Gosto das guitarras nos versos: o andamento é reto, com a 6.ª corda solta sendo tocada repetidamente, interrompida por breves power chords que parecem ter sido escolhidos aleatoriamente - pelo menos esse é o efeito aparente. "Captive Honour" acaba sendo lembrada mais pelos diversos diálogos que retratam alguém sendo julgado por algum crime e levado à prisão. A faixa mais complicada em termos técnicos é "Ashes in Your Mouth", a última do disco, que tem muitas partes e todas elas são muito legais, especialmente para o riff do refrão, e notadamente ainda para a parte em que só as guitarras tocam o riff do refrão - sem acompanhamento pelo vocal.

"Countdown to Extinction" foi um disco excepcional, composto por uma excelente banda de heavy metal no áuge da sua forma musical. Não tenho a menor dúvida de que a formação Mustaine/Ellefson/Friedman/Menza é a melhor que o Megadeth já teve, e não tenho a menor esperança de que Mustaine consiga reunir músicos talentosos de forma tão bem sucedida. Há alguns anos foram lançados todos os CDs da banda, remasterizados e com faixas bônus. Jamais foram lançados por aqui, de maneira que só vi nas lojas a versão importada por aproximadamente 70 reais. Encontrei, então, em Buenos Aires, na versão nacional deles, e trouxe da Ateneo por 18 pesos, uma verdadeira barbada (mais barato que o balaio da nossa Multisom). No caso presente, tem-se "Crown of Worms", uma faixa composta na mesma época em parceria com o guitarrista do Diamond Head, além de demos muito legais de "Psychotron", "Symphony of Destruction" (que é bastante similar ao que a banda costuma tocar nas apresentações ao vivo) e "Countdown to Extinction" (já ouvi em outra oportunidade a demo de "Architecture of Aggression" que é muito legal e teria sido um bônus mais atraente para essa nova edição do disco). No encarte há um depoimento de Mustaine sobre essa época, no qual ele fala do desapontamento de ter obtido apenas o n.º 2 do Top 200 da Billboard. Além disso, o cara revela que ele e Max Norman, o produtor, sabiam que o disco seria muito bem recebido na época. E não por acaso, pois o álbum foi composto de forma brilhante, gravado de maneira soberba (os sons de guitarra e bateria são magníficos) e lançado na época certa.

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