Foi só depois de ler uma entrevista do Doug Aldrich que comecei a apreciar as músicas dos discos mais recentes da carreira solo de Dio; o guitarrista informou que Dio curte as composições mais lentas, e por isso alguns dos seus discos soariam “chatos”, como de fato eu achava. A partir daí resolvi ouvir as faixas e com renovada disposição achei boas coisas. Além disso, acredito que essa predileção de Dio dá a tônica para as novas criações do Heaven and Hell – ou Black Sabbath com Dio.
Como já antecipei, a reunião do Black Sabbath com Dio e a gravação de um disco com músicas inéditas – após as bem sucedidas três faixas da coletânea “The Dio Years” e da turnê e disco ao vivo “Live From Radio City Music Hall” – foi a melhor notícia possível. Os caras voltaram ao estúdio no qual gravaram o meu favorito “Dehumanizer” e o resultado é “The Devil You Know”, recém disponibilizado no Brasil depois de mais de um mês lançado lá fora (inclusive na Argentina – por pouco não comprei uma edição argentina por 40 pila, mas não levei muita fé na informação dos caras de uma loja de CDs de metal mal-localizada no Centro de que o CD, caso fosse lançado aqui, custaria uns 38, 39 reais – uma semana depois dessa conversa, vi no site da Cultura a chegada do disco por 28 pila). Conforme divulgado, as músicas foram compostas por Iommi, Butler e Dio a partir de CDs com riffs e acordes, dos quais foram selecionados os melhores para compor as faixas. A ninguém escapou o fato de que predomina um andamento mais lento nas músicas, e Iommi esclareceu que como as composições estavam boas, decidiu-se pela desnecessidade de incorporar outros riffs ou mudanças de andamento. Vinny Appice também admitiu que experimentou outras batidas e tal, mas optou por simplesmente acompanhar a cadência e manter o ritmo. Bem vistas as coisas, “The Devil You Know” não difere muito das três novas (“The Devil Cried”, “Shadow of the Wind” e “Ear in the Wall”) do “The Dio Years”. Particularmente, preferia que houvesse um pouco mais de ousadia, com mudanças de andamento, e riffs diferentes no meio das músicas (como em algumas de “Dehumanizer”), mas Dio curte músicas lentas, Iommi, Butler e Appice não se opuseram, e assim, de qualquer forma, saúdo os caras por terem se desincumbido bem da tarefa que eles mesmos se propuseram: mostrar a todos que ainda tinham aptidão para fazer um bom disco.
A afinação é meio tom abaixo (Eb Ab Db Gb Bb eb), com exceção de “Follow the Tears” e “Rock and Roll Angels” que estão afinadas em dropped-D meio tom abaixo (Db Ab Db Gb Bb eb). As melhores de “The Devil You Know” são, indiscutivelmente, “Bible Black” (eleita para primeiro single) e “Follow the Tears”. É bem conhecida a extraordinária capacidade de Tony Iommi para criar riffs excepcionais (em todo o disco do cara há pelo menos dois ou três desse tipo), e o riff principal de “Bible Black” é uma verdadeira aula do mestre. A música começa com um delicado dedilhado na região mais grave do violão com cordas de aço; à medida que se intensificam os versos de Dio, acompanhados da mudança dos acordes para G e A e de umas frases legais no baixo de Butler, a faixa segue para atingir o clímax no verso “you´re reading from the bible black” (toda essa parte e o clima de tensão crescente são demonstrações de excelência dos veteranos músicos) e o riff vem com tudo em A, exigindo uns slides da 2.ª para a 8.ª e 7.ª casas. O riff que acompanha os versos é mais tradicional, mas igualmente ganchudo. A outra clássica é “Follow the Tears”. Com direito à introdução climática (teclados e tudo), o riff principal é simples, seco e de efeito devastador, valorizado pela afinação dropped-D e o andamento rasteiro. Tanto quanto em “Bible Black”, aqui as partes são encaixadas perfeitamente, e o bom ouvinte perceberá as sutis alterações na execução de riffs que num primeiro momento parecem idênticos.
O melhor solo do disco aparece durante a parte acústica de “Rock and Roll Angels”: bem expressivo, com várias pausas e bends. Geralmente não aprecio os solos de Iommi – que me parecem todos improvisados, cheios de pentatônicas rápidas e tudo mais -, mas nesse caso o guitarrista se superou no famigerado “feeling”. No mais, o disco é do tipo coeso, no sentido de que todas as faixas parecem fazer parte do mesmo tipo de música (e não uma coletânea de riffs, ou de músicas boas e ruins). Iommi, Butler, Dio e Appice se propuseram a mostrar que ainda eram capazes de fazer um bom disco de som pesado e alcançaram êxito com folga.
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