Em 1996 vi para alugar, na extinta CD Express que ficava na Av. Independência esquina com R. Garibaldi, o então recente lançamento do Dream Theater, um EP com uma música de 23min – a faixa-título “A Change of Seasons” – e quatro covers (três medleys) de grandes bandas e artistas de rock, hard rock e de rock progressivo. Lembro que no caminho da locadora para casa fiquei imaginando como seriam esses covers, e como os caras haviam acertado na eleição das bandas homenageadas (Deep Purple, Queen, Led Zeppelin, Pink Floyd, Genesis, apenas para citar as que eu tenho CD em casa). Conhecia bem o Dream Theater, e o resultado desses covers parecia fascinante (nem esperava muito da faixa título, única composição original e inédita do disco). Algum tempo depois, quando foi lançado no Brasil, comprei o CD por um preço bem barato nas Americanas do Centro.
Portnoy observou certa vez que não há banda de rock progressivo que se preze que não tenha uma música de mais de 20min. No caso do Dream Theater, os caras já tinham desde a época de “Images and Words” uma faixa de uns 17min, chamada “A Change of Seasons” com letra do próprio Portnoy, que acabou sendo vetada pela gravadora para inclusão naquele disco. Essa versão original - a qual, particularmente, entendo que remete ao som da banda durante a fase “When Dream and Day Unite” - foi apresentada em algumas ocasiões nas turnês de “IAW” e de “Awake”, e atendendo ao apelo popular, os caras compuseram novas partes e gravaram uma versão de estúdio (o mesmo que abrigou as sessões para “IAW” e com os mesmos engenheiros de som), notabilizando-se, ainda, por conter a primeira contribuição de Derek Sherinian como membro integral da banda (de fato, comparando-se as versões, percebem-se várias mudanças, inclusive nas letras, todas para muito melhor).
Particularmente, essa é a melhor faixa de 20min já composta pela banda, e é dividida em 7 partes: a primeira é instrumental e conta com um dedilhado de Petrucci acompanhado do piano de Sherinian (achava essa parte tediosa, até que aprendi a tocar o dedilhado e achei genial), seguindo-se um riff arrasa-quarteirão com a guitarra de 7 cordas, o baixo e o teclado de Sherinian, com timbre magnífico (não tenho dúvidas de que Sherinian registrou os melhores timbres de teclado nos discos da banda), além de várias seções instrumentais; a segunda parte começa com um pequeno solo de guitarra –mais uma vez parece parte integrante da música – que antecipa a melodia do refrão, seguindo-se os primeiros versos e um excelente refrão (nas primeiras audições achei supreendente um refrão tão cedo numa música de 20min... a música parecia já a caminho de terminar antes, no entanto, de ingressar na primeira terça parte... mas esse é um dos jeitos de se compor músicas longas); a terceira parte tem um dedilhado com guitarra limpa muito legal, que exige abertura e agilidade das mãos, mas fora isso não é tão complicado de tocar depois de muito treino (lembro que quando ouvia não sabia de onde saiam tantas notas daqueles acordes – só com o auxílio da tablatura que as cosias ficaram mais claras); a quarta parte é instrumental, com vários riffs e passagens técnicas bem legais; a quinta parte tem vocais e é bem dramática, e tem um solo longo e muito melódico de Petrucci; a sexta parte é outra instrumental; a última parte é uma espécie de gran finale, com um tema de guitarra e tudo mais. “A Change of Seasons” contém o melhor solo de teclado de Sherinian e de um tecladista da banda, e é a melhor e mais completa música de 20min que os caras já registraram.
Inicialmente a parte de covers é que atrai interesse mais imediato, mas o ouro mesmo é a faixa-título original e inédita. Afinal, depois de algumas audições, os covers ao vivo se tornam repetitivos e previsíveis, como qualquer disco de cover e como qualquer disco ao vivo. Mas é notável o excelente resultado dos medleys, tanto pela execução como pela escolha dos covers. A primeira é uma clássica de Elton John, “Funeral for a Friend/Love Lies Bleeding”, que permite uma longa introdução de Derek Sherinian acompanhado de solos de John Petrucci, que dá espaço para a empolgante segunda parte com vocais muito bons de James LaBrie.
Como fã de Deep Purple, teria pensado em uma centena de covers melhores ou mais interessantes (afinal, todas as bandas que não querem fazer cover de “Smoke on the Water” fazem cover de “Perfect Strangers”), mas deve-se admitir que a versão do Dream Theater para “Perfect Strangers” é muito boa, e traz como distinção a utilização da 7.ª corda no riff quebrado da parte instrumental (no original, a banda de Blackmore toca esse riff em A e depois em E, e o Dream Theater modula para B, uma cavalice).
A banda se revela, no entanto, nos últimos dois medleys: o primeiro, contendo três faixas clássicas e muito boas de rock do Led Zeppelin (“The Rover”, “Achilles Last Stand” e “The Song Remains de Same”), e o segundo, com músicas consagradas de diversas bandas (“In the Flesh” do Pink Floyd, “Carry On Wayward Son” do Kansas, “Bohemian Rhapsody” do Queen, “Lovin´ Touchin´ Squeezin´” do Journey, “Cruise Control” do Dixie Dregs, e “Turn It On Again” do Genesis). Diferentemente do caso anterior, as músicas escolhidas não são óbvias e a fidelidade – sobretudo na execução dos riffs de guitarra – é admirável (em alguns casos o cover, aqui, é melhor que o original).
O Dream Theater jamais veio a repetir essa estratégia de lançamento de um EP nesses termos; discos continuaram a ser lançados com regularidade, e durante um tempo a banda promoveu edições de Natal para os que se inscreviam para aquisição do CD especial no site, contendo mais covers, demos, remixes e edições alternativas – mais recentemente, Portnoy abriu seu baú de raridades e através da Ytse Jam Records são lançados discos do tipo “bootlegs oficiais” contendo shows especiais (a execução na íntegra de “Master of Puppets”, “The Number of the Beast”, “Dark Side of the Moon”, “Made in Japan”) e demos dos discos de estúdio (v.g., “Awake Demos”).
2 comentários:
Em compensação, os covers de estúdio lançados juntamente com o péssimo novo álbum deles não fazem jus a estes, com sua execução sem feeling e sonoridade "de plástico".
Cara, também achei a versão de "Stargazer" e demais uma porcaria...
Postar um comentário