terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Discografia Deep Purple (Melhores discos de todos os tempos) – Parte VI “Machine Head” (1972)

Sobre alguns CDs do Deep Purple já dediquei resenhas anteriormente, em vários momentos neste blog. Assim, escrevi sobre (I) “Burn” quando quis me referir a alguns dos melhores discos de todos os tempos, assim como sobre o (II) “California Jam”, memorável show da banda com o Mark III em 1974, o (III) espetacular disco ao vivo “Made in Japan”, definitivo registro do Mark II em 1972, e primeiro disco que ouvi da banda, o (IV) “Welcome Joe”, um bootleg no qual Joe Satriani foi o guitarrista numa turnê em que Ritche Blackmore deixou definitivamente a banda, e esta ainda não tinha encontrado um substituto em bases permanentes, e o (V) “Come Hell or High Water”, com o registro ao vivo da banda na turnê do “The Battle Rages On”, última com o Blackmore, e que foi o primeiro CD que adquiri da banda. Com esse esclarecimento, passo a escrever sobre os CDs do Deep Purple da minha coleção particular, reiniciando pela parte VI.

O Deep Purple já havia se consolidado como importante banda de hard rock dos anos 1970 com o lançamento de “Deep Purple in Rock” no começo daquela década. O disco seminal continha algumas das que se tornaram clássicos da banda, como “Speed King”, “Black Night” e “Child in Time”, além de outras excelentes composições. No ano seguinte, em 1971, os caras soltaram o “Fireball”, que alterna bons momentos com outros sem inspiração. Naquele ano, contudo, a banda voltou ao estúdio para compor o disco com sua música mais conhecida.

Sabe-se bem que a clássica formação Blackmore/Gillan/Glover/Lord/Paice reuniu-se num hotel em Montreaux para gravar seu novo trabalho com o famoso estúdio móvel “Rolling Stones mobile”. Cumpre notar que, diferentemente de discos como “Burn”, são pouco significativos os overdubs, especialmente no que se refere às guitaras; veja-se que em “Burn” a maioria das faixas conta com dois registros de guitarra, geralmente com versões diferentes para as mesmas partes (p. ex., uma guitarra toca acordes, ou uma oitava abaixo, e a outra toca notas soltas, licks e melodias, ou uma oitava acima), enquanto que em “Machine Head” Blackmore tocou apenas uma linha de guitarra em quase todo o repertório (evidentemente que alguns solos foram dobrados – executados por duas guitarras sobrepostas – como em “Highway Star”). Lembro, no entanto, que um amigo dos tempos de faculdade reclamava do que considerava “magra e fraca” a guitarra de Blackmore nesse disco, pois o som do teclado seria mais evidente. Ele ficava inconformado com o fato de que o disco é espetacular, mas as guitarras não acompanhavam (ele achava que era questão de volume, ou de distorção). É para ver como não dá para agradar a todos. O resultado foi lançado em 1972. E se trata de um magnífico exemplar de rock pesado, do tipo em que todas as faixas são antológicas. Pode-se dizer que muitas das melhores performances dessa formação, que se convencionou chamar de “Mark II”, se encontram nesse álbum.

Praticamente todo o repertório é bastante conhecido. As mais evidentes são “Highway Star” e, principalmente, “Smoke on the Water”, mas “Maybe I´m A Leo”, “Lazy”, “Space Truckin´”, “Pictures of Home”, com maior ou menor frequência, mantiveram-se nos set lists das turnês há quase quarenta anos. A ordem das faixas facilita a audição, começando os trabalhos com uma música rápida, apropriadamente denominada “Highway Star”. Desde logo, na introdução, gosto de ouvir a levada de bateria de Ian Paice, sobretudo quando ele começa a bater na caixa pouco antes dos versos cantados – o timbre é espetacular, e foi obtido com a bateria posicionada no banheiro do hotel. Universalmente conhecido e debatido é o solo de guitarra de Blackmore. Como diz Steve Morse, alguém que se propõe a tocar “Highway Star” tem que tocar o solo nota-por-nota como está no disco. Acrescento que só Blackmore mesmo pode improvisar, e é certo que o cara fazia isso regularmente. Não obstante, o solo de teclado de Jon Lord é igualmente matador, embora o cara tenha feito uma versão tão boa quanto no “Made in Japan”.

Há mais de 10 anos, quando ainda me dedicava a tirar na guitarra músicas dos meus favoritos, aprendi a tocar “Maybe I´m a Leo” de ouvido. Existe um bom cover de Paul Gilbert num tributo lançado pela Magna Charta. É bem cadenciada e Blackmore mandou bem num solo com pentatônicas bem encaixadas.

“Pictures of Home” tem várias partes e é uma das grandes composições obscuras desse disco. Yngwie Malmsteen gravou uma versão mais pesada e muito legal no seu disco “Inspiration” de 1996. A introdução de bateria é marcante, tanto quanto o riff inicial, bem dinâmico. Nos versos as guitarras tocam um padrão que foi adaptado e tornado bastante típico pelo Iron Maiden. Há espaço para um pequeno solo de baixo de Roger Glover, e longos solos de Blackmore e Lord.

Em “Never Before” também há uma introdução de bateria de Ian Paice, até que a música inicia efetivamente com o riff executado durante os versos, o qual poderia até ser de heavy metal com execução mais agressiva e o abafamento necessário nas cordas da guitarra. Diferentemente de todas as bandas de heavy metal e hard rock, não é muito comum músicas do Deep Purple com utilização de tom em E (muitas das músicas são em G ou A ou F ou sei lá o que), e “Never Before” quebra essa regra. Talvez seja a composição mais fraca do disco, mas isso pode ser objeto de ampla contestação.

O que não é objeto de discussão é o fato de que o riff de “Smoke on the Water” é possivelmente o riff de guitarra mais conhecido de todos os tempos. Existe até uma espécie de recorde de número de guitarristas tocando-o simultaneamente. Há explicações sofisticadas sobre o modo como esse riff se comporta harmonicamente (quartas, quintas, sei lá), mas o fato é que se trata de um dos riffs mais simples que pode existir, de absorção instantânea pelo cérebro, e é por essa simplicidade que o riff é sofisticado. Acrescente-se, à receita, o baixo marcado de Roger Glover, pulsando sobre a nota G (seria o timbre de um Rickenbacker?), e a levada de bateria de Ian Paice no hi-hat e caixa, sendo que Jon Lord dobra o riff com o Hammond num timbre bem pesado, parecendo quase uma guitarra com distorção, praticamente inventando a moda dos tecladistas que se valem de timbres parecidos com guitarras. O que é simples e nada sofisticado, no entanto, é a parte de guitarra durante os versos. É comum alguém eventualmente ficar com vergonha de compor algo muito trivial, a não ser que se trate de uma banda de punk ou de grunge; Blackmore, no entanto, aparece com dois acordes, G e F, tocados nota por nota no padrão G-D-G, G-D-G, G-D-G. G-D-G, G-D-G, F-C-F, G-D-G, G-D-G. O refrão já é mais caprichado – C-F-C, G#-Eb-G#, G. Marcante também é o solo de Blackmore, sobretudo nos caprichados bends ao final, quando a base (teclado e baixo) voltam à execução do riff principal.

É possível ser criativo e original tocando blues, e o Deep Purple exercita isso em “Lazy”. A letra de Ian Gillan tem um pouco de humor, mas o destaque é todo do trabalho instrumental. Afinal, a parte cantada só entra decorridos 4min de execução. Um riff magnífico e trabalhoso de guitarra (dobrado pelo teclado), acompanhado de paradas apropriadas de baixo e bateria, e solos extensos e fantásticos de Blackmore e Lord. Há espaço para amplas improvisações nas apresentações ao vivo, e numa rápida pesquisa no youtube se encontram um ou outro vídeo nesse sentido.

A última faixa é “Space Truckin´”, que tem uma estrutura bem fechada de introdução – verso – refrão, mas ainda assim serve para improvisações extensas, conforme “Made in Japan” e “California Jam”. É outra bem fácil de tirar de ouvido as partes de guitarra. Ian Gillan dá uns gritos bem agudos ao final, consolidando sua reputação como um dos maiores e mais influentes vocalistas do estilo.

Da mesma sessão resultou uma balada sentimental, “When A Blind Man Cries”, lançada em algum lugar como lado-B de algum single. Na edição comemorativa de 25 anos foi acrescentada essa faixa ao track list (achei despiciendo adquirir esse CD, que foi lançado como duplo, encarecendo o produto - um CD contendo a edição remixada em 1997, e um outro com o álbum remasterizado, sendo que os bônus são apenas “When a Blind Man Cries” e versões “quadrophonic mix” para “Maybe I´m a Leo” e “Lazy”).

Mesmo antes do lançamento de “Machine Head” a banda já estava em (permanente) turnê, e são lendários os registros em solo japonês que deram origem ao “Made in Japan”. Mais um disco de estúdio (“Who Do We Think We Are”, de 1973) e devido a conflitos internos e exaustão da vida na estrada, Ian Gillan e Roger Glover saíram da banda e deram lugar a David Coverdale e Glenn Hughes, inaugurando o Mark III (reporto-me às resenhas de Burn”, de 1974, e do “Califórnia Jam” do mesmo ano, conforme acima).

A versão que tenho do “Machine Head” é anterior à remasterizada edição de 25 anos, e foi adquirida na Grammy & Classic Rock na Gal. Chaves numa troca de alguns CDs.

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