quarta-feira, 23 de julho de 2003

Os discos do KISS - parte II (Creatures of the Night)

Creatures of the Night – trata-se do meu disco favorito de todos os tempos; faço questão de ressaltar isso de início. Lançado em 1982, após o fracasso de Music from the Elder, Creatures retomou a idéia de lançar um disco de rock pesado (hard rock), numa tentativa de mostrar aos fãs que o Kiss ainda era capaz de produzir bons discos como no passado (anos 70). Mas a essas alturas, boa parte dos fãs já havia abandonado a banda, diante do surgimento de novas bandas de heavy metal e hard rock no início dos anos 80. Iron Maiden, Judas Priest, Motorhead, Saxon, Def Leppard, Diamond Head, entre muitas outras bandas inglesas ganharam notoriedade quando o movimento punk foi perdendo espaço.

Desse modo, Creatures não gozou do sucesso esperado. Injustamente, devo dizer. Trata-se de um grande disco de hard rock, composto de 9 músicas comprometidas com o estilo. Em Creatures ouvem-se riffs pesados e rápidos. O baixo também se destaca em algumas músicas. E a bateria de Eric Carr se beneficiou tremendamente com a mixagem, alcançando um dos melhores registros da história do rock. Entendo que nesse processo de mixagem, as guitarras não levaram a melhor, ficando às vezes difícil de ouvir alguns riffs (notadamente em Saint and Sinner e Danger). Mas isso não compromete o álbum, e é daquelas imperfeições que compõem as grandes obras.

O disco inicia com a faixa título, e uma abertura fenomenal de Eric Carr. A edição remasterizada do cd realça ainda mais esses detalhes. Cabe referir, neste passo, que uma das grandes belezas desse disco é que o lead guitar Ace Frehley não participou das gravações. Todos os solos foram gravados por outros guitarristas: e a tarefa de adivinhar que guitarrista gravou qual solo é bastante divertida (na minha opinião). No caso da música Creatures of the Night, o solo principal (um dos melhores que eu já ouvi) foi gravado por Steve Ferris. Como curiosidade, vale lembrar que Eddie Van Halen chegou a comparecer às gravações para gravar o solo da faixa-título, cogitando-se até que seria o guitarrista substituto de Ace. Os demais mini-solos (fills entre os versos) foram obra de Adam Mitchell (que compôs essa música com Paul Stanley). Bela música, belos versos, fantástico solo, e brilhante de bateria de Eric Carr.

Saint and Sinner é a primeira faixa de Gene Simmons. Tem um andamento mais cadenciado. Sobressai aqui a bateria muito criativa de Eric Carr, que acompanha os versos de maneira bem inusitada; no refrão Eric acompanha as guitarras criando um belo efeito com os vocais. O solo (memorável), tudo indica, foi patrocinado por Vinnie Vincent (então Vincent Cusano), que compôs várias músicas nesse álbum e viria a ser o substituto de Ace na turnê e no álbum seguinte.

Keep me Coming é de Paul, e tem um bom refrão que repete o título da música várias vezes. O riff principal tem uma característica de Paul, apresentada também em outras músicas como The Oath (do Elder) e Get all you can take (do Animalize). Outra característica do Paul em muitas músicas é um trecho antes e depois do solo (ver Under the Gun do Animalize). Gosto muito do pre-chorus “Sweet little innocent girl...”. Seguramente o solo foi gravado por Vinnie.

Rock and roll hell foi composta por Gene, Jim Vallance (que compôs muitas outras com o Kiss) e Bryan Adams (o cantor canadense aquele), e é calcada basicamente no baixo de Gene. Bastante marcante e até representativa do ânimo do baixista/vocalista naquela época. “Get me out of this rock and roll hell”. Eric é bastante criativo nessa música (acompanha os versos com o tom, e ajuda a construir a ‘tensão’ que termina com o refrão). Nessa e em todas as músicas Eric produz belos ‘rolos’ na bateria (acho que essa é a melhor característica dele, e nesse disco particularmente – todos os rolos são brilhantes; o modo como ele insere na música, marcando o fim de um trecho e o início de outro). Não estou muito seguro, mas parece que o solo é de Vinnie também.

Danger é uma música bem rápida, composta por Paul e Adam Mitchell (a dupla da faixa título). Aqui acho que a mixagem prejudicou as guitarras. Bom refrão. Solos de Vinnie, com certeza. Eric dá mais um show na bateria – há um overdub no hi-hat. E os rolos são soberbos. Talvez seja a melhor contribuição de Eric no álbum. Repare na tensão criada no pre-chorus que vem depois do solo – Paul cantando com muita emoção.

I love it loud é hino da banda nos anos 80. A música é inconfundível, todo mundo conhece. O bumbo de Eric está com afinação bem mais pesada (como nas outras músicas). O solo é extremamente simples – pode ter sido tocado por qualquer um; não tem como identificar nenhum estilo. Ao final, há uma utilização do recurso fade out – fade in – fade out (a música parece que termina, mas volta pra, aí sim, terminar).

I still love you é a balada de Paul. É tão triste e comovente que eu nao costumo ouvir regularmente. Destaque todo especial pra letra, realmente tocante. Já é de conhecimento público, mas não custa lembrar que Eric foi quem gravou o baixo. O solo, com muito feeling, ao que parece foi gravado por Robben Ford.

Killer até hoje eu a vejo como a música dispensável do disco. O riff lembra Led Zeppelin na fase hard (primeiros discos). Não é ruim a música, mas não é nada memorável. Solos de Vinnie Vincent, seguramente.

War Machine encerra o disco com um peso nunca visto em um álbum do Kiss. Composta pelo trio Gene/Vallance/Bryan Adams, tem uma boa letra e um belo riff, bem heavy mesmo. O solo tem todo o jeito de ser de Vinnie.

Concluindo: é o meu disco favorito de todos os tempos, e minha ligação com ele vai além da questão musical: visualizo nele algumas lembranças de infância – lembro da época em que foi lançado, do poster do disco nas lojas Breno Rossi, e da turnê promocional no Brasil (e do programa especial que foi ao ar pela TV Globo). Mas foi um disco excelente lançado numa época desfavorável para a banda, pois os fãs, após 3 discos desacertados, já haviam abandonado a banda. Sabe-se que os shows no Brasil foram os últimos com máscara – e para a banda retomar o seu lugar dentre as grandes bandas de rock, não bastava lançar apenas bons discos: era preciso mais. Desligar-se do passado de excessos e excentricidades era medida que se impunha e isso passava por tirar as tradicionais máscaras e mostrar que a banda não estava mais para brincadeira.

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