sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Melhores discos de todos os tempos - Metallica "Black Album" (1991)

É como eu digo: nada como uns bons riffs com guitarras distorcidas. Nos primórdios de 1991, quando se instalou a MTV por aqui, e durante algum tempo, não achava nada de bom no Metallica. Inclusive colocava no “mute” quando rolava “Enter Sandman” ou “The Unforgiven” no Disk MTV (que era um baita programa, apesar de que as mesmas músicas eram tocadas todos os dias, o que se tornou enfadonho em pouco tempo). Mas em 1992 os caras tocaram no tributo ao Freddie Mercury, no antigo Wembley Stadium (transmitido o VT pela Bandeirantes, numa sexta-feira de Páscoa), e então achei sensacional a performance ao vivo dos caras (acho que tocaram “Stone Cold Crazy” e “Enter Sandman”), muito impressionado que fiquei com o baterista (que marretava e pulava com fúria, e ainda mantinha o ritmo). Com o ouvido mais treinado, e já em 1993 (na era do cd player), sob orientação dos meus colegas Diego e Gustavo Rocha, adquiri o “Master of Puppets”. Bem, admito que então (e até hoje) esse cd não causou maior impressão. Posteriormente, aluguei na MadSound o “Black Album" (backup na C-60), mas foi só em 1995, quando aluguei mais uma vez, desta feita na CD Express ,que cai na real e finalmente vi que se tratava de um disco matador.

Sabe-se que “Black Album" é o disco de maior sucesso do Metallica, e que representou a superação da fase anterior dos caras, mais underground, digamos assim. Afinal, depois do 1.º disco (“Kill ´em All”) com músicas mais diretas, a partir do 2.º álbum (“Ride the Lightning”) a banda foi aperfeiçoando um estilo de heavy metal com músicas longas e várias partes complexas nas quais mudanças de andamento (rápido/lento, 4/4, 7/8, 5/4, 7/4) não eram incomuns, numa espécie de metal progressivo (o próprio Hetfield sintetizou jocosamente, mas com precisão, ao anunciar o “...And Justice for All medley” – que consistia nos principais riffs do disco de mesmo nome - , no vídeo do show no México de 1993, que se tratava de um “rhythm guitar solo”). Além disso, os caras não produziram singles, nem gravaram clipes para a MTV até 1988 (“One” do “...And Justice for All”). Então, a um só tempo, com o “Black Album", o Metallica: (a) encurtou e simplificou as músicas, significando isso que as músicas ficaram mais acessíveis e que não havia mais mudanças abruptas de andamento e múltiplas partes com vários riffs, além de que os riffs mesmos seriam diferentes dos dos discos anteriores, em regra sem o característico “staccatto” na mão direita; (b) contou com o renomado produtor Rob Rock (que já havia trabalhado, dentre outros, com Bon Jovi), em desfavor dos produtores dos discos anteriores, o que viabilizou uma melhora significativa no som da guitarra, da bateria e da voz, sem contar ainda nos palpites do produtor sobre as próprias composições, sendo certo que deu força para que o Metallica ousasse e tentasse coisas novas e diferentes como gravar suas primeiras baladas – o que era impensável até então; (c) gravou vídeos para as principais faixas do disco, o que representou a democratização do acesso a um público novo – não raro aparece alguém para dizer que acha muito legal aquele “primeiro disco do Metallica, o da capa preta”.

Então, se por um lado essas características do “Black Album" proporcionaram novos fãs, como eu, por outro lado desgostou os que já eram afinados com o som dos caras e esperavam por um disco no mesmo estilo de “metal progressivo” (e aqui é comum alguém dizer que o último grande disco do Metallica é o “Master of Puppets”, como os meus colegas de colégio). Talvez tenha sido mesmo decepcionante (para estes últimos), ao esperar por um novo “Master of Puppets” ou “...And Justice for All”, deparar com o “Black Album". Mas tomando este último por si só, não vejo razões para não considerá-lo perfeito. Salta aos ouvidos (sic) que o som das guitarras e da bateria é impecável. O peso das guitarras está lá, não há como negar, sem prejuízo da definição das notas (todas são muito bem ouvidas); e a bateria é marcante, bem diferente do som de lata dos discos anteriores (e de um posterior, o “St. Anger”). Além disso, James Hetfield, em 1991, estava no auge da forma vocal, e nessas condições e com esse parâmetro, não consigo ouvir os primeiros discos do Metallica sem pensar em como a voz do cara nesses discos é muito ruim.

No vídeo “A Year in a Half”, oportunamente gravado durante as sessões e a turnê do “Black Album”, tem uma cena, provavelmente registrada após as gravações e pouco antes da finalização das sessões de mixagem, na qual Rob Rock anuncia para Hetfield e Ulrich que o disco conta com músicas que serão clássicos, não apenas da banda, mas do próprio heavy metal. Entendo que ele não podia estar mais certo, vez que “Enter Sandman”, “Sad But True”, “The Unforgiven”, “Wherever I May Roam” e “Nothing Else Matters” são clássicos indiscutíveis.

A música que abre o disco, “Enter Sandman”, é a mais conhecida, e foi a primeira música que tirei no violão em março de 1995 (comprei a cópia da partitura na MadHouse, que ficava numa galeria na R. Duque de Caxias, perto do viaduto da Av. Salgado Filho – ou da Av. João Pessoa, depende do ponto de vista - a loja não existe mais, e era um dos 10 melhores lugares para comprar CDs em Porto Alegre). Aprendi muito com essa faixa, sobretudo pela utilização invariável da 6.ª corda solta (“E”, ou “mi”). Não demorei para perceber que a 6.ª corda solta, bem vistas as cosias, é um excelente e utilíssimo recurso para dar dinâmica aos riffs que funciona sempre (às vezes a 6.ª corda solta, por si só, tocada determinado número de vezes por determinada freqüência, já proporciona o riff... como em “Kill the King” do Megadeth). “Enter Sandman” á uma música bem simples para o padrão Metallica, com partes bem definidas e, por isso, facilmente assimiláveis. Clássico instantâneo. É tocada em todos os shows desde então e até hoje, notadamente no “encore”.

Algumas músicas me parecem perfeitas, com início, meio e fim formatados com precisão e na medida certa. Esse é o caso de “Sad But True”. O riff principal é matador, com pull-offs que jamais ouvi em lugar algum, e que nunca imaginaria a utilização dessa técnica para fazer um riff desse tipo (não por acaso, considero um riff espetacular). A afinação é um tom abaixo (6.ª corda em D, 5.ª corda em G, etc), o que confere um peso especial, mas não demasiado. E o groove é muito legal. Lars Ulrich acompanha a cadência do riff no hi-hat, durante as paradas (o que confere uma tensão, que se resolve naquele tá-tá-tátátá na caixa), e a batida é impiedosa e certeira no restante. Os solos de Kirk Hammet são os melhores do disco inteiro (ou os segundos melhores, porque o solo em “The Unforgiven” pode ser considerado o melhor...). Enfim, toda a “Sad But True” me parece uma música de heavy metal sem precedentes, no riff, versos e refrão. Durante o solo e em várias partes é perceptível que os riffs são tocados com algumas alterações, o que só contribui para tornar a composição como um todo muito interessante tecnicamente.

Para mim é impertinente a questão de saber se “The Unforgiven”, assim como “Fade to Black” (do disco “Ride the Lightning”) é ou não uma balada. O certo é que é uma baita composição do Metallica, praticamente sem recorrer à onipresente 6.ª corda solta; o riff dos versos é com a 4.ª e a 5.º corda soltas. A alternância entre momentos suaves e pesados pode lembrar Led Zeppelin (que tem um punhado de músicas nesse esquema como “Babe I´m Gonna Leave You” do seu disco de estréia em 1969), embora entenda que a comparação é desprezível, vez que “The Unforgiven” é tão boa e tão bem composta e executada que dispensa esse tipo de cotejo. É particularmente notável o solo de Kirk Hammet, e a composição e gravação deste foi um dos momentos legais do vídeo “A Year and a Half”, no qual se mostrou que as tentativas anteriores do guitarrista haviam sido todas infrutíferas (os solos eram bem ruins mesmo), motivando Rob Rock a dar uma bronca no cara para ele “fazer o dever de casa” e aparecer com um solo decente, o que eventualmente acabou acontecendo.

O melhor groove do disco, no qual inevitavelmente ou a cabeça ou o pé acompanham a levada, é o de “Wherever I May Roam”. Nas revistas de guitarra costumo ler comentários sobre músicas desse tipo ressaltando a interação entre os acordes E e Bb, que formam alguma espécie de escala inusual, com resultado bem expressivo, o que, de fato, é justamente o caso. O riff é, como tantos outros, exemplar a respeito da fase inspirada que a banda vivenciava: não há nada que lembre, nem remotamente, nos discos do Metallica ou de qualquer outra banda, esse riff memorável. O solo de Hammet acompanha a sugestão da música para escalas orientais, e se utiliza eficazmente do timbre do pedal wah-wah.

“Nothing Else Matters” é uma boa balada, que começa com um dedilhado magnífico, em relação ao qual o Diego costumava dizer, na época do colégio, que utilizava como se fosse diapasão para afinar o violão/guitarra. Evidentemente que não era uma música típica para o Metallica até então, mas se tornou uma balada típica do Metallica a partir de então (o disco seguinte, “Load”, contou com “Mamma Said”). Particularmente é bem legal de tocar; o Christian e eu já tivemos oportunidade para fazer uma versão bem defensável com dois violões e voz.

As outras músicas todas são muito boas, em maior ou menor extensão. Gosto muito (a) do riff e da dinâmica mais rápida de “Through the Never”, (b) do riff, da parte da guitarra nos versos e do clima de “The God That Failed”, (c) o riff muito bem sacado e original, a parte da guitarra nos versos, e as partes de bateria de “Of Wolf and Man”; (d) o riff principal, a parte de guitarra nos versos, o riff principal depois do solo de Kirk Hammet, em “Holier Than Thou”; (e) as partes de bateria e alguns riffs com staccatto em “Don´t Tread on Me”; (f) a introdução de baixo de Jason Newsted, o riff, e os solos de Kirk Hammet em “My Friend of Misery”; (g) o solo de guitarra de Hammet em “Struggle Within”.

Particularmente, gosto bastante da abordagem “tantos-riffs-quantos-possíveis-em-uma-só-música” que caracteriza discos como “...And Justice for All”, mas admito que é fácil perceber que o “Black Album", com sua produção impecável, enfatizou mais do que nunca os riffs de guitarra (pesados mas com definição), distribuídos com parcimônia nas músicas. Dessa forma, cada faixa é um momento único no qual praticamente cada riff se torna memorável. Particularmente, entendo que é o melhor disco lançado nos anos 1990, bem como é o disco mais importante lançado nos anos 1990 (embora possa conceder que neste último caso talvez o disco mais importante tenha sido o "Nevermind" do Nirvana, mas aí a minha opinião já não é tão favorável, pelo contrário...).

Top 5 “Black Album” riffs:
1) Sad But True
2) Wherever I May Roam
3) Through the Never
4) Holier Than Thou
5) Of Wolf and Man
Bonus track: The God That Failed

Um comentário:

Anônimo disse...

Guilherme, cara, parabéns pela ótima descrição do disco e das músicas. Pelo conhecimento musical que demonstra ter mas, principalmente, pela fluidez do texto, mto bem escrito, que confere ao seu conhecimento musical o respeito devido a um educated man.

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