Diante da minha coleção de cds, uma pessoa próxima deu uma olhada por alto e lascou: "mas tu não tem nenhum cd dos Beatles?". Isso me lembra outro comentário, feito pelo Giulia, há muitos anos: o grande amigo dos tempos de colégio foi direto, "só tens isso?". Não posso culpá-los, pois apesar da quantidade, não há muita variedade, pois em grande parte as prateleiras são ocupadas por Kiss, Deep Purple, Metallica, Megadeth, Dream Theater, Yngwie Malmsteen, Van Halen, Black Sabbath, Led Zeppelin, etc.
Quanto aos Beatles, duas coisas: (a) dos 12 discos, por qual começar? (b) vale a pena comprar um desses 12 discos, ou o melhor é pegar uma boa coletãnea e se livrar de parte das músicas mais fracas da banda? Nas minhas pesquisas, já ouvi alguma coisa e não me entusiasmei particularmente por nenhum. O fato de que sempre há um disco diferente dos Beatles que é considerado definitivo ou o melhor ou o mais marcante também dificulta a tarefa de eleger um para aquisição (já vi serem citados "Revolver", "Sgt Peppers", "White Album", e até "Rubber Soul"). Meus pais gostam bastante e em casa tinha uma fita k7 de "Help!". Cheguei a ouvir com um pouco mais de atenção o "Revolver", mas recentemente acabei ficando curioso em relação a dois discos: "Abbey Road" e "Let It Be", pois o primeiro foi o último a ser gravado pela banda, mas o segundo foi o último a ser lançado, quase concomitantemente à comunicação oficial do encerramento das atividades dos "fab four".
Mas o que fundamentalmente me afastou dos discos dos Beatles foi o preço manifestamente exagerado e, por que não, extorsivo, exigido pelas lojas, geralmente mais de 30 reais. Afinal, o disco mais recente foi lançado há trinta e oito anos. Quem tinha direito já lucrou o suficiente com eles, e sendo como são parte do senso comum cultural há todos esses anos, entendo que seria mais do que razoável um preço do tipo 10 reais, para facilitar o acesso de todos a esses discos. Com 10 reais por disco, não haveria espaço para pirataria de todo o tipo, e qualquer pessoa poderia ter em casa a discografia inteira, talvez. Se a discografia do Black Sabbath e do Led Zeppelin já freqüentou os balaios com preços atrativos, nada mais natural que os discos dos Beatles serem vendidos nessas mesmas condições.
Então, aproveitando a inauguração do shopping novo, e a promoção da Saraiva, elegi, pelo critério menor preço, por parte do repertório e pelo fato de que a Osmar Band tem uma versão própria (tão boa e significativa quanto) da música mais conhecida, o "Let It Be". Afinal, esse disco contém a magnífica faixa-título e outra que é das minhas favoritas, "Get Back". Esta última é uma das composições mais próximas do hard rock - consigo facilmente imaginar umas guitarras legais para acompanhar os versos. Ouvindo a versão original, admiro a quantidade de melodias curtas na guitarra de Harrison durante a faixa inteira, bem como o solinho bem postado.
"Let It Be" é uma das músicas de rock mais conhecidas de todos os tempos, e é muito bela e simples. Melodiosa até não poder mais. É bem conhecida a bronca que McCartney tem sobre a produção do disco, conferida a Phil Spector. Pelo que andei lendo, a intenção original era gravar um disco "roots", ou "stripped down", o mais "live" possível. É por aí que se explica a quantidade de músicas bem básicas. E na contracapa há um esclarecimento prévio de que muitas faixas foram gravadas ao vivo, e durante a audição do disco fica bem fácil adivinhar quais são. Por razões que ainda ignoro, as fitas foram mandadas para Spector que introduziu uma série de orquestrações em algumas faixas, e a mais notória foi a também bela "The Long and Winding Road" (se todos têm um beatle favorito, o meu é McCartney).
Algumas músicas dos Beatles têm uma sonoridade familiar - em outras palavras, parece que já conhecemos a faixa, embora estejamos ouvindo pela primeira vez. Essa foi a sensação durante "Two of Us", que tem levada folk (violões e bumbo) e vocais harmonizados que inspiraram uma porção de bandas e aqui não posso deixar de lembrar, p. ex., as primeiras composições do Kiss na época Wicked Lester (existe um vídeo em que aparecem Paul Stanley, Gene Simmons e Eric Carr fazendo vocalizações para grandes clássicos dos Beatles, nesse sentido).
Mais melodia e mais sensação de "já ouvi isso em algum lugar" em "Dig a Pony", e é provável que já tenha ouvido mesmo a parte "Aaaaaaall I waaant is yooooooou". As intervenções (pequenos licks) de Harrison durante os versos me lembraram as que Steve Howe costuma fazer no repertório do Yes.
"Across the Universe" parece bem viajandona na parte "nothing is gonna change my world" (repetidas vezes), com a tão cara cítara.
Diz-se que ao tempo em que "I Me Mine" foi gravada em estúdio, Lennon já não fazia mais parte da banda. A faixa tem uma dinâmica interessante - começa de um jeito, faceira, "I Me Mine" e tal, até que fica mais rocker na parte "I me me mine", e essas partes vão se sucedendo até o final.
"Dig It" começa com um incomum "fade in", parece uma improvisação, e termina com "fade out" segundos depois, ao qual segue o piano arrepiante de "Let It Be" e os primeiros versos com McCartney. A música é perfeita, nada a tirar nem por (talvez se possa admitir a exclusão das orquestrações de Spector - acho que aí ficaria mais rocker e menos pomposa). Harrison não é virtuose mas sabe tocar os bends necessários para fazer um solo melodioso nessa faixa-título.
Depois de uma música tão grandiosa, fica estranho ouvir "Maggie Mae", um rock como tantos outros e que parece terminar pela metade. "I Got a Feeling" já se parece mais com uma música completa, com riffs e tudo mais e é outra que representa a intenção "crua" que a banda estava buscando originalmente. Do mesmo balaio vem "One After 909", e "For You Blue" - embora essa seja mais "blues" com slides e violão de cordas de aço.
Não consigo imaginar "The Long and Winding Road" sem as orquestrações de Spector - talvez fosse o caso de ouvir o "Let It Be - Naked" lançado em 2003. Outra bela composição de Macca.
O disco encerra com a faixa que, na verdade, deveria ter aberto os trabalhos: "Get Back": "Get back, Jojo! Go home".
2 comentários:
Eu tenho o Let It Be - Naked em casa (dei de presente pra Cris anos atrás), mas nunca parei pra ouvir com calma a diferença pro original!
Meu brother, vou te passar um estojo com todos os EPs ( duas músicas de trabalho e duas "lado B") dos Beatles, pra tu fazer uma degustação e chegar as tuas próprias conclusões sobre qual vale a pena ou não. Infelizmente o Alemão se apoderou do estojo, mas resolvemos isso na porrada no próximo ensaio.
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